será
que me safo?
olhos
cor de mel
esta
Páscoa fui à terra. sou alfacinha e dizem que Lisboa não é terra,
por isso é bom ter terra para onde ir, especialmente nas épocas
festivas. na minha terra por afinidade comem-se petiscos
maravilhosos: o bolo de azeite com queijo da serra, a farinheira com
arroz de grelos, o bolo escuro da minha madrinha. são dias
excepcionais e por isso, comemos coisas excepcionais. também fazemos
coisas excepcionais, como revisitar os sítios da aldeia onde
brincámos, as ruas por onde passava a procissão - lembro-me de um
vestido azul petróleo especialmente feito para a festa, - pela fonte
de água fresca onde brincava com as primas da minha Avó que são
também minhas primas e onde íamos buscar a água num pote de barro.
quando vamos à terra há sempre muitos familiares para visitar. os
que conhecemos desde sempre, os que conhecemos mas já não vemos há
muito tempo, e sobretudo os que não conhecemos mas que nos conhecem.
também eles são todos da nossa família por afinidade. e há sempre
uma agenda de compromissos muito intensa e encontros com muitos
beijos e abraços e perguntas e constatações de todo o género. "ai
que a garota está tão crescida!". é bom ir à terra porque
fazemos e comemos e reencontramos lugares e pessoas excepcionais.
ouvidos
para escutar
para
ouvir tudo, mesmo tudo o que não queremos ouvir. estou cansada de
ouvir a palavra 'subir'. os combustíveis vão 'subir', a água vai
'subir', a electricidade vai 'subir', os passes de transporte público
vão 'subir', as scuts vão 'subir' (alguém me pode explicar
a lógica das scuts mas sem usar esta palavra?...). estou
cansada de ouvir notícias com títulos que me fazem 'subir' o sangue
à cabeça. estou cansada de ouvir a demagogia de uns e a
imbecilidade de outros. os meus ouvidos têm-me doído. menos quando
oiço o novo álbum dos Gotya ou as manhãs da Antena 3 ou o riso dos
momentos felizes. mas mesmo na inevitabilidade de, socialmente,
termos de ouvir o que não queremos, nas nossas vidas pessoais
podemos sempre escolher o que queremos ouvir. e depois aceitar que
também há consequências para as palavras que escolhemos não ouvir
porque nem sempre são ditas por querer, ou porque quem as disse não
soube como dizê-las.
boca
mágica
hoje, o
dia em que escrevo esta crónica, é sexta-feira-treze. popularmente
conhecido como o dia do azar, mas agora não está na moda ser-se
popular e deve ser por isso que oiço muita gente dizer que adora as
sextas-feiras-treze. eu sempre passei por baixo das escadas e dos
andaimes e gosto muito de gatos pretos em quaisquer outras
sexta-feira-do-ano. também descobri agora que hoje é o dia
internacional do beijo. e ainda que nos dias que correm não esteja
na moda e tão pouco seja popular dizer o que sentimos, sou louca por
beijos. sou louca por beijos. sou louca pelos teus beijos. teus,
beijos carinhosos, Mãe. teus, beijos apaziguadores na testa. teus,
beijos que estalam na minha boca como as peta-zetas, teus em mim, na
minha face ou nas pálpebras dos meus olhos cerrados. mas hoje, no
dia em que escrevo esta crónica e é sexta-feira-treze, acordei com
o sabor amargo do teu para mim, meu para ti, último beijo.
nariz
empinado
acabei
de ver o meu primeiro vídeo de Tony Robbins. para quem não sabe,
este sr. é considerado um dos gurus de desenvolvimento pessoal do
mundo. eu chamar-lhe-ia antes um catalisador ou um contribuidor para
a renovação das energias pessoais - sim, as nossas energias também
são renováveis, assim como as nossas vidas, como é que ainda é
tão difícil percebermos isso?... por vezes quem ouve e/ ou vê
estas pessoas falar uma primeira vez pode pensar que é tudo um
cambalacho. um chorrilho de clichés do tipo 'querer é poder'
e coisas essas afins. acho que também já pensei um pouco isso até
ter dado por mim a ler um desses livros cuja capa receamos que
denuncie algum estado de perturbação grave. mas isso é porque
ainda temos de aprender muito sobre nós e estes livros e estes
autores são tão legítimos quanto os grandes clássicos da
literatura, no seus devidos segmentos. uma coisa é certa: somos
aquilo de que nos rodeamos e deixo-vos aqui um desafio que todos os
dias coloco a mim mesma: rodeiem-se de quem e do que é importante
para vocês e para as vossas vidas e não do que querem que seja.
mãos
trémulas
esqueci-me
do telemóvel em casa hoje. e exactamente como se prevê nestas
situações, toda a gente tentou contactar-me hoje. para remarcar o
compromisso há muito desejado, para cancelar a manicure que só faço
uma vez quando o rei faz anos, para pedir desculpa quando já não há
mais desculpas para pedir. um dia sem telemóvel.
um-dia-sem-telemóvel. pensei em voltar para trás mas decidi que não
dependo de algo sem o qual vivi durante tantos anos da minha vida.
enquanto cresci só havia um telefone lá em casa, fixo e preto e que
rodávamos para marcar os números e através do qual esperávamos
receber todas as mesmas notícias que hoje recebemos. e mesmo que não
viessem a tempo, essas notícias, esses imponderáveis, havia sempre
um tempo que era mais real, um tempo para tratar de tudo pessoalmente
sem que nada se perdesse, pelo contrário. pelo contrário.
(intuição
declarada)
um dia
escrevi-te: "os meus olhos são castanhos esverdeados. quando o
sol lhes toca aquele anel que define o círculo perfeito da íris
fica mais verde. o castanho é cor de mel. os meus olhos riem sempre
a duas cores e tornam-se ainda maiores. sorrio. as minhas
mãos são pequenas mas os meus dedos são compridos com os nós
grossos. costumavam dizer-me que tinha dedos de pianista e eu
gostava. nunca toquei piano. mas quero andar de mãos dadas. sonho."
um dia escrevi-te assim, despida. e para que essas palavras não
fiquem esquecidas no mundo virtual algures num enredo não tão menos
virtual, hoje, no dia em que escrevo esta crónica e que é
sexta-feira-treze, ainda vou sonhar mais, beijar mais e passar por
baixo de muitas mais escadas e andaimes. mas a sorte sou eu quem a
define. viva a sorte das sexta-feira-treze.
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