Tuesday, July 10, 2012

por Ana Rebelo

fechada para balanço


perdi um soutien e umas cuecas
as semanas acabam e começam, nunca nenhum dia é igual ao outro. não sei porquê, mas isto hoje soa-me muito bem, hoje como quem diz 'nos dias que correm'. eu pensava que era realmente uma nova oportunidade, sabem, aquelas coisas que nunca acontecem e que se acontecem é porque how-stupidly-lucky-we-are-so-lets-not-fuck-this-up-again. mas isso não tem de significar que vá ser realmente desta-vez-é-mesmo. até pode não ser isso e na verdade, quase nunca é, na verdade tudo não passa de whishful thinking e que mal há nisso, todos sonhamos que um dia vamos ser algo que ainda não somos. mas os sonhos plantam-se e regam-se e aninham-se em nós até poderem co-existir com a nossa realidade. enquanto me despia ele olhava para o meu corpo através do seu, querendo consumir-se nele, querendo-me. e eu pensava na fragilidade disto tudo. às vezes estas oportunidades que parecem novas são mesmo velhas no seu significado mais primário. o amor nem sempre é tudo, nem acredito que estou a dizer isto mas é verdade que hoje, nos dias que correm, é preciso mais do que o amor sentido pelo outro. é preciso o amor dentro de nós.


o espelho que caiu e não se partiu
agora-é-tudo-ou-nada. às vezes a vida quer-se com esta practicabilidade, é fundamental que assim seja. se não tivermos a coragem de assumir os nossos medos e mesmo assim, enfrentá-los, só nos estaremos a afastar mais de quem somos. quando começamos a racionalizar tudo é porque já estamos perdidos, totalmente submersos pelo lodo que só nos empurra ainda mais para baixo. não me lembro de ter tomado qualquer decisão importante na minha vida que não tivesse sido instigada pelo medo. sempre vivi assim, aliás, desconheço outra forma de vida terrena. está na hora, vai. vai lá encontrar o teu lugar seguro que não seja em mim, vai ao seu encontro como eu fui ao encontro do meu, sem resistência. eu não posso ajudar, eu não posso desamar e voltar a amar e depois sentir que não entendes que me dás mais um corte no coração quando me rejeitas rejeitando os frutos do nosso amor mais altruísta. não entendes. é que eu já tinha juntado os cacos e agora eles são um espelho de talha dourada que está pendurado na parede, para o qual olho todos os dias e todos os dias me faz lembrar que está na hora de te deixar partir. 


fiquei doente, de cama
com uma bela febre-dos-fenos. com direito a uma pedrada de anti-histamínicos e nasomed e ar para respirar saído de um aerosol. é horrível precisar de ir buscar ar a um tubinho quando o ar em volta é rarefeito. o meu corpo ressentiu-se, primeiro ficou dormente e branco, não interessa se tinha estado a tomar sol e a minha pele estava sensível. o meu corpo estava a ressacar do bliss dos últimos dias. assim de repente tudo tinha passado, todas as palavras e gestos e intenções e mudanças - passaram. foi como se nada tivesse acontecido, mas aconteceu porque o meu corpo acusou e faliu. não havia nada a fazer e depois de um bom banho quente caí na cama num delírio purgatório, os suores eram fortes e a minha testa estava quente e os meus olhos, húmidos. não, não foi de chorar. não chorei. não chorei porque não fazia sentido. era como se eu fosse um barco que estivesse a navegar em águas calmas e de repente a tempestade atingia-me e eu tinha de recorrer à bússula e cartas marítimas e içar as velas para sobrevivê-la. e assim fiz, tão rapidamente quanto a previsibilidade do que me assolou.


tudo às claras
e fé em Deus. ou nas energias eólicas. ou nos beijos debaixo do azevinho à meia-noite. ou nas escadas e nos gatos pretos. ou nas figas. ou nas pragas rogadas aos céus em dias de trovoada. ou no álcool e na droga ilegal. ou no sexo. ou nos anti-depressivos. estou-me absolutamente nas tintas para o quê, desde que sim. diz uns belos de uns palavrões, dá uma boas gargalhadas, goza com as roupas das pessoas no metro, retribui o sorriso ao rapaz dos olhos-verdes que estava hoje no café. faças o que fizeres, o que quer que seja, agora a esperança é o asset mais importante do teu portfólio de carácter. se não tens, arranja, se não sabes como, aprende. porque vais ter de continuar a levantar-te todos os dias e ninguém vai ser brando contigo, os carros vão continuar a poluir a camada de ozono, a estupidez vai continuar a dominar o povo e tu firme, aí, firme como uma barra de ferro. porque não há nada mais irritante do que deixarmos que o zumbido de uma mosca, uma só, nos impeça de dormir uma boa noite de sono. ou então uma alergia ao sol que nos impeça de aproveitar o verão. melhor ainda: orgulharmo-nos das palmas surdas que ecoam na nossa cabeça ante este belo espectáculo que são os nossos dias.


cliente por dente
gosto de honestidade. e gosto mais ainda de honestidade feita com assertividade. às vezes sou dura a dizer as coisas, dizem que sim, mas é a minha expressão determinada apenas a transmitir que é a sério, há coisas que devem ser levadas muito a sério, como o compromisso. pode ser chegar a horas, ser pontual. ou então pagar à empregada no fim do mês. e tanto mais havia para dizer mas só tenho tempo para relembrar que um compromisso dá-se quando as duas partes assumem no empreendimento de qualquer coisa, num dado momento que é também comum. ninguém está a fazer um favor a ninguém. o desafio é mútuo. os ganhos e as perdas, também. o que é que há de tão difícil de entender nisto? pode-se quebrar um compromisso, pode, é claro. mas assumindo todas as consequências, de cabeça erguida. de convicção içada, como as bandeiras. quem não sabe honrar um compromisso não se pode dar ao respeito. e mesmo assim, cá continuamos a levar com isto porque ninguém parece ter tomates para prender essas pessoas por fazerem da vida dos outros um espectáculo de marionetas de baixo orçamento.


(hérnia do hiato)
conheço um mundo de gente insatisfeita com as suas vidas, actualmente. na verdade, o panorama não é muito favorável ao optimismo, mas não devem ser os factores externos a condicionar a nossa forma de digerir as coisas. há muitas pessoas desempregadas mas há outras que estando empregadas, não têm grandes perspectivas. umas dizem às outras (ou a si próprias) que só porque têm trabalho têm de contentar-se e dar-se por felizes 'tendo em conta que'. entendo o princípio básico de sobrevivência mas teremos de ser todos mediocres e calar a vontade de lutar por mais? não será esta a verdadeira crise, aquela que é abafada em nós? é como a auto-motivação, esse conceito bonito que inventaram já no final do século XX que tão somente quer dizer desresponsabilização por quem de dever. está tudo trocado e depois o corpo é que paga, já dizia quem pagou pelo não-conformismo, e pagou bem. 

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